21 de jun. de 2013

Novas ferramentas no BRAHMS facilitam o envio de dados para a rede speciesLink

A versão 7.3 do BRAHMS, lançada na última sexta-feira, dia 14/06/2013, possui importantes implementações que facilitam o envio de dados para a rede speciesLink e permitem a inclusão de mais informações. 



Agora com apenas um clique os usuários podem exportar os dados de suas coleções no modelo de dados DarwinCore. No menu Admin, basta selecionar a opção XML/Darwin export options e depois Darwin Core (suitable for CRIA transfers) e em seguida selecionar o código da própria coleção.

Tela de exportação de dados para o CRIA na versão 7.3.2. em Admin – XML/Darwin export options – Darwin Core (suitable for CRIA transfers).

Outra importante novidade é a exportação dos campos de classificação taxonômica ORDER (ordem) e DIVISION (divisão/filo). A inclusão de dados nesses campos melhora a qualidade das informações disponíveis e aumenta a eficácia das buscas na rede. Informações que podem parecer óbvias internamente para cada coleção, são essenciais quando estamos lidando com a integração de dados de várias coleções na rede. Para plantas e fungos, por exemplo, normalmente as informações taxonômicas são preenchidas somente até família. Se um usuário deseja buscar os registros de todas as briófitas, por exemplo, terá que incluir no formulário de busca todas as famílias! Nesse caso, se todos os registros tivessem o campo divisão/filo preenchido, bastaria buscar por Marchantiophyta | Anthocerotophyta | Bryophyta. O mesmo ocorre para fungos. Muitas coleções possuem um só banco de dados para fungos e plantas. Novamente, para encontrar somente os fungos, o usuário teria que realizar uma busca por todas as famílias. Tem-se ainda que essas buscas retornariam somente os registros que possuem a determinação de família. Na rede speciesLink atualmente existem cerca de 3,4 milhões de registros sem a informação de divisão para plantas e fungos.

Staheliomyces cinctus (Phallaceae, Basidiomycota), um fungo raro que ocorre apenas na região Neotropical (foto: Mario Terra).

Completando as informações
As informações taxonômicas para as espécies podem ser inseridas rapidamente no BRAHMS no menu Taxa – Ver/editar famílias no banco de dados. Nessa tabela estão listadas as famílias com registros na sua coleção e basta incluir a informação de ordem e divisão uma única vez para cada família.

Essas modificações foram sugeridas aos desenvolvedores do BRAHMS após conversas com os usuários. Participe também, mande suas sugestões! E não se esqueça de sempre consultar as dicas de uso no menu superior direito da página de busca do speciesLink!

Saiba mais!
  • Um manual chamado “Tutorial para extração dos dados no modelo DarwinCore (a partir da versão 7.3.1 do BRAHMS)“ com as instruções detalhadas está disponível em: http://splink.cria.org.br/splinker

19 de jun. de 2013

Lacunas: como mapear a ocorrência de espécies e identificar áreas pouco amostradas?

Sistema online permite a visualização de mapas de ocorrência de espécies de plantas e fungos do Brasil, além de agregar informações sobre o status dos dados sobre os espécimes disponíveis online, endemismos e o status de conservação das espécies.


O sistema Lacunas foi concebido pelo Centro de Referência em Informação Ambiental (CRIA) para prover uma ferramenta dinâmica para que os especialistas possam analisar o ‘status do conhecimento online’ sobre espécies da flora brasileira, facilmente identificando as espécies endêmicas, ameaçadas de extinção e suas distribuições geográficas, podendo identificar áreas subamostradas ou acervos que ainda não integraram seus dados online. A partir de uma interface web é possível produzir relatórios integrando registros de ocorrência de espécies de plantas e fungos disponíveis no INCT-Herbário Virtual da Flora e dos Fungos com o conhecimento taxonômico da Lista de Espécies da Flora do Brasil (edição 2012) mais o status de conservação da espécie com base nas listas de espécies ameaçadas de extinção do MMA e da Fundação Biodiversitas. O Lacunas é uma ferramenta importante para a definição de estratégias para novas coletas priorizando espécies e/ou áreas não amostradas, além de identificar grupos taxonômicos para a digitação/digitalização dos dados.

Melocactus violaceus Pfeiff. depositado no Herbário da Reserva Natural Vale - CVRD 13441, LINHARES, ES, BRASIL, 05/09/2011. [lat: -19.137121 long: -39.888076 WGS84]. É considerada uma espécie 'Deficiente em Dados' pela Lista Oficial da Flora Brasileira Ameaçada de Extinção, publicada pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA).


Funcionamento do Lacunas
O sistema conta com filtros taxonômicos e de georeferenciamento. Desta maneira é possível, por exemplo, fazer a busca por uma dada espécie, considerando seu nome aceito e sinônimos, e apenas registros georeferenciados. O filtro taxonômico começa com as seguintes opções: algas, angiospermas, briófitas (subdivididas em antóceros, hepáticas e musgos), fungos (com as opções lato senso e stricto senso), gimnospermas e pteridófitas. A partir da escolha inicial do grupo, novos filtros são apresentados ao usuário possibilitando o refinamento da busca, chegando até o nível de espécie. A importância das coordenadas geográficas de cada espécime depositado nos herbários é enorme, pois em última análise determinam a qualidade e quantidade dos pontos de ocorrência das espécies, informações essencias para modelar a distribuição potencial das espécies com base em seu nicho ecológico. O sistema agrupa as espécies em 4 categorias:

(I) sem registros no Herbário Virtual
(II) com 1 - 5 registros
(III) com 6 - 20
(IV) com >20 registros

Esta divisão visa indicar rapidamente se as espécies possuem um número suficiente de registros para produzirem modelos de distribuição geográfica com uso potencial para processos de tomada de decisão. Em geral, assume-se ser necessário mais de 20 pontos de ocorrência com coordenadas consistentes e distintas para produzir um bom modelo. Para espécies com até 5 pontos obtém-se um modelo exploratório e de 6 a 20 pontos um modelo preliminar. Até o nível de gênero o relatório produz um gráfico mostrando quantas espécies estão em cada categoria de número de registros.

Exemplo da interface do Lacunas analisando informações disponíveis para o gênero Melocactus, Cactaceae. Na coluna da esquerda estão listadas as espécies do gênero agrupadas pelos números de pontos de ocorrência disponíveis, incluindo o status de conservação (clique para ampliar).

A base primária de dados do Lacunas provém da rede speciesLink (http://www.splink.org.br/) e para cada espécie o sistema apresenta mapas de distribuição baseados em dados obtidos em tempo real, checados pelos nomes validados por especialistas na Lista de Espécies da Flora do Brasil (2012). O usuário tem a opção de selecionar apenas os nomes aceitos ou de incluir sinônimos, fazer uma busca exata ou fonética, e ainda escolher o tipo e a qualidade das coordenadas geográficas associadas a cada registro. Quando uma espécie é selecionada, surgem informações associadas, como informações oficiais sobre o status de conservação, endemismo, um mapa contendo os pontos de ocorrência, os estados brasileiros onde ocorre, número de registros de coleta por ano e os provedores dos dados, dentre outras informações.

Informações para Melocactus violaceus (Cactaceae), uma espécie endêmica do Brasil. Além de considerada como 'Deficiente em Dados' pelo Anexo II do MMA, foi classificada como vulnerável pela Fundação Biodiversitas.

Clicando-se no mapa, o usuário é levado diretamente para a interface do speciesLink, com acesso aos dados de todos espécimes coletados para determinada espécie. A partir dessa página é possível realizar várias análises, como criar um mapa, plotando todos os pontos de ocorrência, ou fazer download dos pontos no formato do OpenModeller ou MaxEnt, por exemplo. Os mapas podem ser exibidos pela interface do Google Maps ou Google Earth, sendo que nesses casos cada ponto do mapa é clicável e traz informação sobre a origem do espécime, determinador e local de coleta, com coordenadas em graus decimais e datum. Alguns registros possuem imagens das exsicatas ou material vivo gerenciadas pelo sistema Exsiccatae, permitindo que detalhes sejam verificados rapidamente.

Informações associadas a Melocactus violaceus (Cactaceae) por meio do Lacunas. A partir do relatório de pontos de ocorrência é possível verificar os dados pela interface do Google Maps ou ainda visualizar imagens das exsicatas.

Conservação da Biodiversidade
Além de iniciar a busca utilizando o filtro taxonômico, o Lacunas permite consultar diretamente quais espécies estão na Lista de Espécies Ameaçadas da Flora Brasileira, por meio de links para o Anexo I e Anexo II da Instrução Normativa MMA nº 06 disponíveis na página inicial do Lacunas. Caso a espécie também esteja na lista de espécies ameaçadas de extinção da Fundação Biodiversitas, ao seu nome estará associada uma sigla (EX: Extinta, EW: Extinta na Natureza, CR: Criticamente em Perigo, EN: Em Perigo, VU: Vulnerável). Estas siglas indicam o grau de ameaça seguindo os critérios da IUCN.

Detalhe da associação dos nomes das espécies com o status de conservação com base na Instrução Normativa MMA nº 06 e na Fundação Biodiversitas (clique para ampliar).

Independentemente do método de busca, os resultados sempre mostrarão o número de registros encontrados, na frente dos nomes das espécies, de acordo com os critérios estabelecidos pelo usuário. Além disso, se a espécie constar como endêmica na Lista de Espécies da Flora e dos Fungos do Brasil, ao lado do nome será apresentado o ícone  E . Caso a espécie esteja listada em um dos anexos da Instrução Normativa MMA nº 06, ao lado do seu nome será apresentado o ícone  para espécies ameaçadas de extinção (Anexo I) e  para as espécies com deficiência de dados (Anexo II).

Potenciais usos do Lacunas
Os relatórios apresentados pelo sistema Lacunas necessitam do conhecimento do especialista para poder servir de base para a elaboração de estratégias de pesquisa e fomento, assim como auxiliar o desenvolvimento de políticas públicas considerando os compromissos assumidos pelo Brasil na Convenção sobre Diversidade Biológica. Espera-se que o relatório sirva de subsídio aos especialistas para:
  • Orientar novas coletas, tanto em relação às espécies como também às áreas geográficas prioritárias;
  • Auxiliar na identificação de grupos prioritários para digitação ou georreferenciamento dos dados;
  • Auxiliar na identificação de grupos pouco estudados, indicando a necessidade de formação de taxonomistas;
  • Auxiliar na identificação e avaliação de espécies ameaçadas de extinção.

A tomada de decisão na área de conservação da biodiversidade idealmente deve ser baseada em dados de alta qualidade e precisão. O sistema Lacunas é um exemplo de como ferramentas e programas podem ajudar a aumentar a qualidade e usabilidade dos dados. O desenvolvimento de plataformas de análise de dados como esta possibilita a criação de novas estratégias para pesquisa científica e também nos processos de tomada de decisão.

O caso da espécie Melocactus violaceus (Cactaceae) ilustra como é possível usar o sistema Lacunas como apoio na avaliação do status de conservação de espécies. De acordo com a Lista Oficial da Flora Brasileira Ameaçada de Extinção, publicada pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), M. violaceus é uma espécie “Deficiente em Dados”. O MMA define espécie “Deficiente em Dados” como aquela cujas informações (distribuição geográfica, ameaças/impactos e usos, entre outras) são ainda deficientes, não permitindo enquadrá-la com segurança em uma condição de ameaçada.

Informações do relatório do Lacunas sobre Melocactus violaceus (clique para ampliar).


Porém, utilizando o Lacunas verificou-se que existem 66 registros para esta espécie, 20 deles com coordenadas distintas. Assim, a distribuição geográfica desta espécie se revelou bem documentada. Ainda é possível observar que M. violaceus têm sido coletada com regularidade, sendo que a ultima coleta ocorreu em 2012. Uma vez que estas informações estão facilmente disponíveis, especialistas podem usá-las na reavaliação do status de conservação desta e outras espécies.

 

Implicações práticas
O acesso aos dados é um fator-chave que liga ciência, políticas públicas e decisões legais. Desta maneira, além dos dados primários de biodiversidade estarem acessíveis, é necessária a criação de novas ferramentas para analisar e extrair conhecimento destes dados. Além disso, tais plataformas deveriam ser integradas, não somente dentro do país, mas também com interfaces de outros países, o que possibilitaria análises muito mais completas da biodiversidade. Muitas iniciativas estão sendo estruturadas, mas ainda é um grande desafio fazer com que as e-infraestruturas sejam de fato utilizadas no processo de tomada de decisão. A conscientização, tanto de cientistas quanto do poder público, de que apenas uma parceria sólida entre governo, cientistas, e mantenedores de e-infrastruturas pode promover o desenvolvimento de tais ferramentas é uma prioridade.

Interfaces como o Lacunas são cruciais para instrumentar a tomada de decisão. Nesse contexto o sistema Lacunas é inovador, sendo o resultado de uma parceria bem sucedida entre os mais de 80 herbários e pesquisadores associados do INCT-Herbário Virtual da Flora e dos Fungos do Brasil e os profissionais de tecnologia da informação do CRIA. Espera-se que o Lacunas se torne uma ferramenta importante na definição de novas estratégias para pesquisa científica, direcionando novos trabalhos e assim ajudando a ampliar o conhecimento e a compreensão da biodiversidade brasileira, contribuindo para a definição de novas políticas de conservação e uso sustentável.

Saiba mais!

Texto - Mariane de Sousa-Baena, Ricardo Braga-Neto, Sidnei de Souza, Vanderlei Canhos e Dora Ann Lange Canhos

4 de jun. de 2013

Como contemplar a biodiversidade na era digital?

Tese ressalta a importância de políticas públicas no contexto dos sistemas de informação.

  

Uma sociedade sustentável pressupõe o acesso à informação qualificada não apenas dos envolvidos na sua produção, mas também dos vários segmentos responsáveis pela formulação de políticas públicas. Este constitui o principal escopo da tese desenvolvida pela pesquisadora Dora Ann Lange Canhos, ao analisar os “Sistemas de informação em biodiversidade e a formulação de políticas públicas na era digital”, em estudo centrado no Brasil, considerado um país biodiverso. O trabalho adota como tema a influência das tecnologias da informação e comunicação na circulação do conhecimento técnico-científico e o seu efeito na elaboração de políticas públicas em biodiversidade. Considera que o avanço dessas tecnologias afeta a forma como o conhecimento é produzido e como os resultados são difundidos. Constata que são elas que possibilitam o envolvimento de mais atores na gênese do conhecimento, oriundos de diferentes disciplinas, especialidades, instituições, localidades, países, culturas e realidades sociais.

O estudo rompe com o paradigma tradicional de compartilhamento de dados e resultados científicos por meio apenas de publicações em livros e revistas especializados, não mais suficientes para atender à demanda contemporânea, que necessita não só de dados, não raro de forma instantânea, mas de conhecimentos de processos e análises que permitam maior transparência e reprodutividade dos resultados.

O trabalho leva em conta ainda que não basta a disponibilização dos dados on-line, mas que estes precisam estar organizados de forma padronizada em formatos úteis e utilizáveis, acessíveis, tanto por interfaces humanas como também via serviços web.

Além do papel da tecnologia e da necessidade científica de compartilhar dados, métodos e análises em diferentes escalas e disciplinas, a autora considera a importância do acesso e uso dos dados e aplicativos para os processos de tomada de decisão em escalas local e global. Entende que isto é particularmente verdadeiro quando o tema é meio ambiente e desenvolvimento sustentável. Na tese, a pesquisadora defende que a política para dados sobre diversidade deve promover o seu acesso livre e aberto, sem geração de custos para o usuário, e que as exceções sejam, essas sim, objeto de tratamento diferencial.

A autora destaca a importância de implantação de políticas públicas de longo prazo em relação ao desenvolvimento e manutenção contínua de infraestruturas de dados para armazenar, organizar, preservar, recuperar e disseminar on-line dados e informações sobre biodiversidade. Enfatiza a necessidade das agências e do poder público se capacitarem para se apropriarem desses dados e informações disponibilizadas nas e-infraestruturas, assim chamados os ambientes que também provêm ferramentas e serviços para colaboração e compartilhamento de recursos em pesquisas científicas.

A pesquisa assume características particulares, dado que Dora Canhos trabalha há 12 anos no Centro de Referência em Informação Ambiental (Cria), associação civil, sem fins lucrativos, que tem por objetivo disseminar o conhecimento científico e tecnológico, visando a conservação e a utilização sustentável de recursos naturais. A meta e estratégia do Centro são a disseminação de informação eletrônica como ferramenta na organização da comunidade científica e técnica do Brasil, especificamente na área biológica, com vistas à utilização racional da biodiversidade.

A pesquisadora considera que a sua inserção na vida acadêmica, mais especificamente no Programa de Pós-Graduação do Departamento de Política Científica e Tecnológica (DPCT), do Instituto de Geociência (IG) da Unicamp, contribuiu sobremaneira para a sua compreensão do que seja política científica e tecnológica, ampliando sua capacidade de atuação profissional. “Além disso, participei de um grupo que goza de grande respeito e influência no Brasil e que formou muita gente que atualmente milita na vida pública”, destaca ela.

Em relação à sua orientanda, a professora Maria Beatriz Machado Bonacelli destaca a feliz associação dos conhecimentos sobre o tema trazidos por Dora Canhos com o olhar e o rigor acadêmicos. A docente lembra que o Programa de Pós-graduação em Política Científica e Tecnológica, classificado com conceito seis pela Capes, está completando 25 anos, tempo em que formou 300 mestres e doutores, e que experiências como a da pesquisadora têm um profundo impacto na incorporação de novos conhecimentos na pós-graduação.

Na tese, a autora procura mostrar a oportunidade, a viabilidade e a importância de usar infraestruturas eletrônicas ou digitais (as e-infraestruturas) em biodiversidade para ampliar o acesso e a usabilidade dos dados no desenvolvimento científico e também para a elaboração e avaliação de políticas públicas, contribuindo inclusive para melhorar a qualidade, confiabilidade e completude dos dados e informações.

Ela defende uma política de sistemas livres e abertos, de longo prazo, enfatiza a necessidade da valorização de todos os segmentos que participam na base do trabalho de construção de infraestruturas de dados, porque considera que nos meios acadêmicos e nos institutos se valorizam as pesquisas e se ignoram as importantes contribuições de taxonomistas e outros especialistas envolvidos, os quais garantem a qualidade, organização e disseminação de dados e mesmo a implantação do sistema.

ETAPAS
A revolução das tecnologias de informação e comunicação é considerada hoje como um acontecimento histórico da mesma dimensão da Revolução Industrial (século XVIII). Esse é o lugar também ocupado pela internet e da chamada big data e mesmo da eScience. Ao procurar compreender a influência e o impacto das tecnologias da informação na circulação do conhecimento científico e avaliar o seu efeito na elaboração de políticas públicas em biodiversidade, a autora da tese distingue alguns elementos e privilegia o estudo de três casos.

Primeiramente, apresenta uma breve análise da evolução da comunicação científica, detendo-se nas civilizações antigas, na cultura clássica (600 AC a 500 DC), na Idade Média (500 a 1450), na Revolução Científica (1450 a 1700), nos séculos XVIII a XXI. Essa abordagem procura mostrar a importância da informação eletrônica hoje em relação às comunicações em épocas que a precederam e fatores que determinaram suas evoluções.

Em seguida, ao relacionar comunicação científica e meio ambiente, a abordagem apresenta os fundamentos teóricos da dinâmica da ciência e da tecnologia na atualidade. Conceitua o que deve ser entendido como dados, informação, conhecimento, sabedoria, gênese do conhecimento e comunicação científica, ciência aberta, bancos de informações, infraestrutura de dados e questão ambiental. Na terceira parte do trabalho, ao tratar de e-infraestruturas sobre a biodiversidade, a autora analisa três delas: a rede global “GBIF” (Global Biodiversity Information Facility), a rede mexicana “Conabio” (Comisión Nacional para el Conoscimiento y Uso de la Biodiversidad) e a rede brasileira “speciesLink”. Discute suas principais características e aponta seus aspectos positivos e fragilidades. Nessa abordagem, procurou delinear o que seria mais indicado para a formulação de uma política de informação brasileira voltada à biodiversidade. Por fim, ao relacionar e-infraestruturas e políticas públicas, a pesquisadora discute, a partir da rede brasileira “speciesLink”, a possibilidade de definir estratégias públicas brasileiras em biodiversidade, objetivo central da tese.

CONTEXTO
Os dados sobre a biodiversidade referem-se à ocorrência, na natureza, de plantas, animais, microrganismos e provêm de pesquisas realizadas em universidades e institutos de pesquisa. As amostras recolhidas são depositadas em coleções científicas e os dados divulgados por meio de redes digitais. A rede “speciesLink”, desenvolvida pelo Cria, sistema com o qual a pesquisadora trabalha, integra on-line os dados dos acervos de cerca de 300 coleções biológicas. Para garantir a universalidade do acesso, a informação precisa ser estruturada segundo padrões e protocolos internacionais. O processo demanda a captação, classificação das informações e sua organização para posterior disponibilização.

A tese se propõe a mostrar o que o Brasil vem fazendo nessa área. A organização eletrônica das coleções de informações dá origem às e-infraestruturas. As coleções de todo o mundo podem estar disponíveis de maneira mais ampla em um ambiente de e-science. A professora M. Beatriz Bonacelli lembra que a disponibilidade dessas informações para uso na ciência e na orientação das políticas públicas constitui um fato relativamente novo no Brasil e no mundo, e que demanda avanços.

Esse trabalho revela-se enorme. Há inicialmente necessidade de documentação e manutenção das coleções, com a participação de especialistas, taxonomistas e curadores. Não basta a disponibilização isolada dos dados on-line. Eles necessariamente precisam ser integrados e para tanto há necessidade de montagem de infraestrutura técnica especializada que garanta o recebimento dos dados sem que os responsáveis por estes percam o controle e o domínio sobre eles. No Brasil, o Cria realiza esse trabalho colocando os dados textuais e imagens das cerca de 300 coleções em um banco de dados único, como uma espécie de biblioteca, gerando a partir deles mapas, gráficos e análises disponibilizadas on-line, com vistas a facilitar o trabalho de pesquisadores e formuladores de políticas públicas.

Dora Canhos acrescenta que o sistema on-line possibilitou o trabalho com equipes multidisciplinares, multiculturais de diferentes instituições e países, o que muda a forma, a gênese do conhecimento, fundamental para a questão do meio ambiente. Hoje, além do trabalho do taxonomista na determinação da espécie há necessidade do ecólogo que determina a sua função e de como ela afeta os serviços ambientais; de pessoas que atuem em comunidades locais de forma a integrá-las na preservação dos espaços, etc. A complexidade da tarefa se reduz com a utilização da informação eletrônica, que alimenta o sistema de informação e lhe serve de apoio.

Ela diz que o desenvolvimento das e-infraestruturas é recente e os serviços científicos prestados por curadores e taxonomistas, ao disponibilizarem dados de qualidade on-line, precisam ser valorizados pelo poder público, assim como são valorizados as publicações, livros, aulas etc. E conclui: “Estamos vivenciando um momento de inflexão da comunicação científica, no qual a disseminação de dados on-line ganha importância, com consequências importantes para o desenvolvimento de estratégias e políticas públicas para Ciência, Tecnologia e Inovação”.

Publicação
Tese:Sistemas de informação em biodiversidade e a formulação de políticas públicas na era digital
Autora: Dora Ann Lange Canhos
Orientadora: Maria Beatriz Machado Bonacelli
Unidade: Instituto de Geociências (IG)


Fonte: Jornal da Unicamp, Edição nº 563
Texto: Carmo Gallo Netto
Fotos: Antoninho Perri
Edição de Imagens: Diana Melo