17 de nov. de 2023

Diário de Viagem (Spix e Martius)

Luiza de Paula e Fernando de Matos
Contadores de Histórias, CRIA

Estimados leitores,

Entre as obras dos naturalistas estrangeiros que percorreram o Brasil colonial, os três volumes do livro Viagem pelo Brasil (1817-1820), deixados pelos cientistas bávaros Johann Baptist von Spix e Carl Friedrich Philipp von Martius, são notáveis por sua reputação, destacando-se como uma narrativa de viagem, um inventário científico da natureza local, e um testemunho autêntico, vibrante e colorido sobre a sociedade da época. Um dos inúmeros desdobramentos da Viagem pelo Brasil foi a Flora Brasiliensis, obra monumental que contém tratamentos taxonômicos para quase 23 mil espécies de plantas, incluindo quase 4 mil ilustrações de plantas e paisagens brasileiras. Em tempos apocalípticos, revisitar as obras desses viajantes nos ajuda a refletir sobre o nosso passado, presente e futuro, bem como sobre a enorme importância da popularização da ciência para o mundo.

É nesse contexto que o Centro de Referência em Informação Ambiental (CRIA) se uniu ao Google Arts and Culture (GA&C), para realizar o projeto de Exposição Virtual intitulado: “Vida e obra dos naturalistas viajantes Spix e Martius”. Nesse projeto, foi produzido um conjunto de histórias, divido em duas partes. A primeira delas ficou à cargo da Dra. Karen Macknow Lisboa (USP) e visou apresentar todo o cenário que antecede a obra Flora Brasiliensis, incluindo o contexto histórico, a expedição de Spix & Martius e seu legado. A segunda parte ficou sob nossa responsabilidade e teve como foco a Flora Brasiliensis, explorando sua construção, as paisagens descritas, algumas das espécies de plantas mais emblemáticas, bem como o trabalho dos botânicos envolvidos. No total, foram elaboradas 55 histórias, explorando o universo de imagens e metadados da obra que estão sendo disponibilizados na plataforma GA&C como resultado da parceria com o CRIA. 

Inspirados pelos relatos dos naturalistas, descrevemos aqui nossas aventuras e processos criativos durante esse projeto, com uma linguagem que às vezes remete aos viajantes do século XX.

PARTE I - A ESCOLHA DOS VIAJANTES E SUAS HISTÓRIAS

A honrosa escolha para a escrita e revisão das histórias recaiu sobre nós dois, jovens cientistas brasileiros, botânicos e naturalistas: Luiza de Paula e Fernando de Matos. Recebemos, portanto, a 08 de Novembro de 2022, o aviso de seguir viagem pelos textos e pranchas da Flora Brasiliensis, na missão de elaborar histórias de popularização da informação contida nessa magnífica obra. No último ano, percorremos os textos em latim com descrições minuciosas de lugares e espécies botânicas da Flora Brasiliensis. Além disso, mergulhamos nas litogravuras de paisagens e plantas que ilustram essa obra. Deveríamos, sobretudo, além das observações e pesquisas científicas nas nossas especialidades, contactar, quanto possível, pesquisadores do INCT – Herbário Virtual da Flora e dos Fungos e outros colaboradores, afim de escrevermos histórias conjuntas, no melhor espírito da Flora Brasiliensis de Martius, que contou com a participação de 65 pesquisadores de diferentes países. Além desses deveres que havíamos assumido, foram-nos feitos também, em relação aos restantes ramos das ciências naturais, especiais pedidos, com histórias encomendadas e sugeridas.

Nossas interações, remotas e hipermediadas, configuraram uma espécie de viagem no tempo. Poucos de nós se conheciam pessoalmente, mas as afinidades pelas expedições naturalistas nos aproximaram durante as 49 reuniões virtuais que realizamos, quando percorríamos de forma conjunta, nós e os integrantes do CRIA, o roteiro da viagem de Spix e Martius pelo Brasil. Foi por meio de nossas conexões virtuais, mas nada superficiais, que vivenciamos os episódios vividos pelos naturalistas, que serviram de base para as nossas histórias. Algumas foram histórias vividas, outras imaginadas e sonhadas, criadas no espaço imaterial das redes e de nossas mentes.

Percorremos todos os cinco biomas brasileiros, e escrevemos, por exemplo, histórias sobre “As árvores que nasceram antes de Cristo na Amazônia”, “5 ninfas guardiãs da vegetação do Brasil”, “Os aromas da Caatinga”, “O Cerrado, a fruta e o lobo”.

PREPARATIVOS PARA A VIAGEM

Com as histórias prontas, foi-nos sugerido pelo CRIA, participar do 73º Congresso Nacional de Botânica, realizado em Belém do Pará, no intuito de divulgarmos nosso trabalho. De imediato, aceitamos o convite. Primeiramente, porque tínhamos o desejo de compartilhar nossa experiência com nossos colegas botânicos. Além disso, porque tínhamos a imensa curiosidade de revisitar locais percorridos pelos viajantes, que tiveram Belém como a porta de entrada para territórios Amazônicos. 

A fim de satisfazer essas obrigações e desejos, tratamos de reunir todos os apetrechos para viagem tão esperada, e rapidamente fizemos os necessários preparativos. Depois de tudo, quanto possível, pronto, e remetidos os livros, instrumentos, celulares, computadores, máquinas fotográficas, aplicativos de reunião, chapéu, óculos de sol, protetor solar, botas, vestimentas de campo, roupas de banho e roupas formais para a palestra e minicurso do congresso. Preparamos uma mala multifuncional, pois seria uma viagem com objetivos variados, e encetamos a viagem a 27 de outubro de 2023, a Luiza, de Belo Horizonte, e o Fernando, de Curitiba, para Belém do Pará.

MINICURSOS E PALESTRAS

Ali, na Cidade das Mangueiras, às 8h da manhã do dia 28 de Outubro de 2023, após um ano de trocas, nos conhecemos pessoalmente pela primeira vez na Universidade Federal do Pará (UFPA), onde ministraríamos o minicurso intitulado:

“Revisitando a Flora Brasiliensis: storytelling como ferramenta de apoio à popularização da ciência no Brasil”. 

Registramos esse momento:

Na sequência, recebemos os alunos, que gentilmente nos contaram sobre suas experiências com o tema da divulgação científica, o que aguçou a nossa curiosidade e criou um clima muito colaborativo. Entre os participantes estavam professores de botânica do ensino superior, doutorandos, mestrandos e estudantes de biologia. Passamos 8 horas com eles numa sala da UFPA, com um misto de alegria e entusiasmo. Compartilhamos experiências, mostramos alguns exemplos, e fizemos exercícios de escrita. Os textos improvisados versaram sobre samambaias azuis, avós cuidadoras de plantas, tempos decoloniais, tacacás, jambus, Flora Brasiliensis e naturalistas. Debater a popularização da ciência na UFPA, tendo como pano de fundo o Rio Guamá e a floresta Amazônica foi experiência muito gratificante. A contemplação desta mágica visão arrebata o espectador, especialmente quando ele não teve antes oportunidade de conhecer tal floresta tropical.


A 31 de outubro, reunimo-nos com os integrantes do CRIA e INCT, para o simpósio: “Herbário virtual: ciência, arte e inovação”. A nossa palestra, intitulada “Legado digital da viagem de Spix e Martius pelo Brasil: ciência, arte e cultura”, teve uma audiência diversa e rendeu ótimos debates. Essa foi a primeira vez que apresentamos os resultados do nosso projeto para o público geral, pois nossas histórias de divulgação científica ainda não encontram-se online, o lançamento oficial da GA&C está previsto para o primeiro semestre de 2024. Em 40 minutos de palestra, apresentamos o website da Flora Brasiliensis, a página do Google Arts & Culture, a coleção do CRIA dentro da GA&C (ainda não disponível online), e algumas de nossas histórias de popularização da ciência. Como o tempo era curto, selecionamos apenas uma história de cada tipo, começando com a biografia de Martius, seguindo com uma história de paisagem (Martius na Amazônia, um passeio botânico pela litogravura n. 1 da Flora Brasiliensis), e finalizando com uma espécie de planta (espiga-de-sangue, Helosis cayanensis).

Mostramos como as histórias estão interligadas por meio de hiperlinks e comentamos sobre as possibilidades de abordagens com a Flora Brasiliensis digital (ciência, arte e cultura). Também apresentamos uma de nossas “galerias de bolso” sobre os cinco biomas do Brasil, criada com uma ferramenta recém lançada pela Google. Ao final da palestra, convidamos todos os presentes para entrarem em contato conosco caso tivessem interesse em fazer parte da nossa rede colaborativa e produzir suas próprias histórias para este projeto. Cerca de 30 potenciais histórias surgiram desse convite, o que nos encheu de alegria e nos deu uma forte sensação de dever cumprido.

No simpósio, discutimos também sobre os temas dos outros palestrantes, como os avanços e conquistas do INCT-Herbário Virtual (Dr. João Renato Stehmann), os recursos disponíveis na interface de busca da rede speciesLink (Dra. Dora Canhos) e o Catálogo de Plantas das Unidades de Conservação do Brasil (Dra. Thuane Bochorny). Discutir temas relacionados à divulgação científica num contexto de conservação da biodiversidade foi ao mesmo tempo desafiador e satisfatório.

Na foto estão: João Renato Stehmann (UFMG), Silvia Rodrigues Machado (UNESP), Leonor Costa Maia (UFPE), Lana da Silva Sylvestre (UFRJ), Luiza Fonseca Amorim de Paula (CRIA), Dora Ann Lange Canhos (CRIA) e Fernando Bittencourt de Matos (CRIA).

2 comentários:

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  2. Gostei muito, todos estavam contentes.

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